Niterói-RJ: Caiçaras da praia do Sossego mais próximos da garantia ao direito à moradia
O caso dos Caiçaras da praia do Sossego em Niterói deu passos importantes para conquistar seu direito a moradia. No dia 2 de setembro, o Juiz Federal Willian Douglas, responsável pela ordem de demolição, se retirou do caso após responder a pedido de suspeição feito pelo advogado das famílias e duas semanas depois a procuradoria de Niterói emitiu ofício declarando que a casa restante não está localizada em área pública.
Após a remoção de duas das três casas pertencentes as famílias Caiçaras da praia do Sossego, ocorrida no dia 12 de agosto, os moradores e ativistas continuaram tentando reverter a ordem de remoção das três casas, expedido pelo Juiz Federal Willian Douglas. Segundo os oficiais de Justiça, a terceira casa não foi demolida também “por uma questão de logística”.
Enquanto isso, as três famílias dividem a única casa que restou. O pescador Cláudio, com sua esposa Rosângela e a filha de 6 anos, Júlia, estão morando na cozinha da casa, enquanto outros se dividem entre a sala e o quarto.
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Segundo o Juiz, as casas estariam localizadas em “área de marinha”, alega também que aquelas pessoas teriam invadido o local e não são pescadores. No processo que levou a essa sentença há um laudo da SPU, solicitado pelo próprio Juiz, que afirma que todas as casas encontram-se em área de marinha, porém o laudo não possui as medições com os equipamentos necessários para tal conclusão.
Poucas semanas antes da remoção das duas casas, o advogado das famílias já vinha tentando provar que a casa principal (que não foi demolida) encontra-se dentro de um loteamento privado. Uma planta da própria prefeitura, um documento de RGI (Registro Geral de Imóveis) e recibos de pagamento de IPTU na posse dos moradores, comprovam as conclusões do advogado.
Além disso, o Núcleo de Pesquisas sobre Práticas e Instituições Jurídicas da Universidade Federal Fluminense (NUPIJ/UFF) fez uma pesquisa na área, utilizando instrumentes de precisão GPS, e elaborou mapas e laudo que comprovam que apenas um pequeno pedaço de uma das três casas estaria dentro da área de marinha, o que não justificaria a demolição.
As famílias possuem documentos que comprovam seu reconhecimento como família Tradicional Caiçara, como membros do Fórum das Famílias Tradicionais de Niterói, e carteirinha de pescador. Moradores da região de Camboinhas, próxima a praia do Sossego, e frequentadores da praia deram depoimentos de que costumam ver membros da família fazendo pesca submarina por apneia (mergulho sem equipamento de respiração) e trazendo do mar mariscos, peixes e polvos. Jornalistas do CMI-Rio estiveram no local e puderam registrar membros das famílias em trabalho de pesca.
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A prefeitura de Niterói possui um papel importante nesse processo, pois pode informar em ofício que as casas não estão em área de marinha e que a casa principal se encontra em propriedade privada. Os moradores tentaram entrar em contato por diversas vezes com as secretarias da prefeitura responsáveis pelo caso, assim como com o próprio prefeito, no entanto estes nunca estavam disponíveis para atender.
Após a demolição das duas casas, os moradores encontraram com o secretário Waldeck Carneiro, em um encontro de comunidades tradicionais, que garantiu que ajudaria no processo sobre o caso e pediu prazo de alguns dias. Mais uma vez, passado o prazo, os moradores não conseguiam mais contato.
Para pressionar e garantir que a terceira casa não seja demolida, no dia 09 de setembro, as famílias e ativistas ocuparam a prefeitura exigindo uma reunião com a secretária executiva, Maria Célia, que não pode atender alegando estar passando mal e foi embora. Com a resistência dos ocupantes, o secretário de habitação, Atratino Cortes, fez o atendimento. Contudo, afirmou não ter as informações necessárias para discutir o caso e marcou uma reunião para o dia seguinte.
Na reunião marcada estavam presentes, os secretários de Habitação, Urbanismo, meio ambiente e o procurador de justiça, Carlos Raposo, além do advogado e membros das famílias, o vereador Paulo Eduardo e o representante do Fórum das Famílias Tradicionais de Niterói, Fernando Tinoco.
O advogado e os familiares apresentaram os documentos e o laudo do NUPIJ/UFF que comprovam que a área não é de marinha. O secretário Atratino garantiu que os documentos seriam analisados e que a prefeitura emitiria ofício afirmando que a casa restante não está em área pública. Durante a reunião o procurador de Justiça e o Secretário de Habitação garantiram que a terceira casa não seria demolida.
Uma última reunião foi marcada para o dia 28, mas foi desmarcada por parte da prefeitura e depois a prefeitura não se mostrou mais disponível.
No dia 2 de setembro, o Juiz Federal Willian Douglas, responsável pela ordem de demolição se retirou do caso após responder a um pedido de suspeição feito pelo advogado das famílias. O recurso de suspeição alegava que o Juiz não estava levando em consideração a existência de idosos, crianças e gestantes ao emitir a ordem judicial, infligindo os estatutos do idoso e da criança.
Antes de se retirar do caso, o juiz afirmou ter feito todo o possível pelas famílias e que é conhecido por suas “ações em favor dor vulneráveis, dos pobres e dos necessitados”, ele se refere ao aluguel social e a inclusão das famílias no programa Minha Casa, Minha Vida.
Willian Douglas é também o Juiz responsável pela ordem de remoção das famílias tradicionais Caiçaras que vivem na Praia do Imbuhy há pelo menos 150 anos. Desde 1901 a área do Imbuhy vem sendo ocupada pelo exército brasileiro e se tornou um espaço de lazer para oficiais e amigos, inclusive moradores alegam que o próprio Willian Douglas é um frequentador do local. Acredita-se que o objetivo da remoção é transformar o local em um Resort de luxo para oficiais das forças armadas.
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Na primeira semana de outubro, a procuradoria de Niterói emitiu ofício declarando que a casa restante não está localizada em área pública.
Apesar do afastamento do Juiz suspeito e do ofício emitido pela procuradoria, ainda existe a ordem de remoção e demolição da terceira casa. As famílias aguardam a anulação dessa ordem de despejo.